AUMENTO DE FORÇA E MASSA MUSCULAR EM ATLETAS
DE CULTURISMO SUPLEMENTADOS COM PROTEINA



INTRODUÇÃO
A quantidade de proteína dietética recomendada pela maioria dos comitês specializados em nutrição tem variado entre 0,8 (Canadian Department of National Health and Welfare, 1983; US Food and Nutrition Board, 1989; Food and Agricultural Organization, 1985), 1,0 (Australian National Health and Medical Research Council, 1987; Dutch Nutrition Board, 1988 - para mulheres) e 1,2 g/kg de peso corporal/ dia (Dutch Nutrition Board, 1988 - para homens) para todos os indivíduos adultos sadios, independente do estilo de vida, idade, peso, composição corporal e tipo de atividade física (LEMON, 1991).

Atualmente, existem muitas controvérsias sobre a utilização destas recomendações em praticantes regulares de atividades físicas diferenciadas e, principalmente, em atletas de culturismo, visto que estas recomendações basearam-se, primeiramente, em
cálculos do balanço nitrogenado (nitrogênio consumido menos o excretado), porém, de indivíduos essencialmente sedentários.

Vários autores (BUTTERFIELD & CALLOWAY, 1984; DRAGAN et al., 1985; LEMON et al., ARNOPOLSKY et al., 1992; TARNOPOLSKY et al., 1988)advogam a suplementação protéica para melhoria do desempenho físico, tanto pelo poder energético dos aminoácidos (nos exercícios de resistência), como pela melhoria do processo anabólico, aumentando
a disponibilidade de aminoácidos essenciais para gerar acréscimo de massa muscular, acelerando a taxa de recuperação durante o treinamento (nos exercícios de força).

Em 1994, KUHN realizou estudo sobre o efeito do trabalho de carga no metabolismo dos aminoácidos em 8 indivíduos saudáveis e verificou que o exercício intenso aumenta a demanda do organismo humano para a ingestão de proteína dietética de alto valor biológico.

Outros estudos (LEMON et al., 1992; TARNOPOLSKY et al., 1992) em jovens do sexo masculino sugerem maior necessidade protéica para praticantes de treinamento com pesos ou contra-resistência (força). Segundo tais autores, esta necessidade seria em torno de 1,2 a 1,7 g/kg de peso corporal por dia.

Uma justificativa que parece bastante razoável para isso é que o esforço gerado pelo treinamento de força induz ao processo de hipertrofia muscular (aumento da massa muscular), mediante uma maior retenção de aminoácidos, que somente é possível pela obtenção de um balanço nitrogenado positivo. Entretanto, nem todos os pesquisadores concordam com a necessidade de dietas hiperprotéicas (LEMON et al., 1992), preferindo aceitar que a atividade física regular promove melhoria na economia total de nitrogênio, facilitando sua fixação.

Segundo TARNOPOLSKY et al. (1988), culturistas de elite consumindo dietas altamente protéicas (2,77 g/kg de peso corporal/dia) têm demonstrado elevado balanço nitrogenado positivo. Hipoteticamente, este alto consumo de proteínas poderia resultar em maior ganho de massa muscular e força, visto que o consumo de aminoácidos induzido pelo treinamento estimularia o aumento da síntese protéica.

Com base nas informações apresentadas acima, o propósito deste estudo foi investigar as possíveis adaptações nos níveis de força e massa muscular geradas, em trinta dias de experimento, pela associação entre o treinamento com pesos e dois regimes
dietéticos diferenciados, contendo cerca de 1,5 e 2,5 g de proteína/kg de peso corporal/dia respectivamente, em atletas de culturismo.

CASUÍSTICA E MÉTODOS
Sujeitos
Seis atletas de culturismo, na faixa etária dos 22-29 anos (26,07 ± 2,98 anos), do sexo masculino, foram previamente selecionados para fazer parte do estudo. Como pré-requisitos para inclusão no experimento foram consideradas as seguintes condições: possuir experiência mínima de 3 (três) anos de prática em exercícios de sobrecarga, estar em fase de treinamento para hipertrofia muscular, não ser fumante,
não ser etilista, não fazer uso de esteróides anabólicos ou similares, além de não apresentar histórico de doenças metabólicas.

Todos foram convenientemente informados sobre a proposta do estudo e procedimentos a que seriam submetidos e assinaram declaração de consentimento esclarecido.

Protocolo de treinamento para hipertrofia
O protocolo de treinamento foi aplicado por seis semanas consecutivas, sendo que as duas semanas iniciais (fase de pré-treinamento) serviram para a equiparação dos níveis de condicionamento muscular dos atletas e as quatro subseqüentes visaram o
aumento da massa muscular (fase de treinamento hipertrófico ou de aumento do volume muscular).

O protocolo adotado foi o classicamente utilizado nos treinamentos de culturismo em fase de hipertrofia, envolvendo programação de treinamento de seis dias consecutivos intercalados por um de descanso. Este protocolo englobou três programações de treinamento: A, B e C.

Cada programação constou de três exercícios por grupamento muscular, com quatro séries para cada exercício. O número de repetições empregadas foi 12/10/8/6 RM, respectivamente, sendo utilizado o método de treinamento com cargas variáveis, conhecido como meia pirâmide (adaptado do método de pirâmide crescente descrito por RODRIGUES & ROCHA, 1985). As exceções foram os exercícios para os grupos musculares
da panturrilha (15-20 repetições), antebraço (12-15) e abdômen (20-30), por apresentarem características distintas das dos demais grupamentos (conjugam
força e resistência muscular).

As cargas utilizadas foram compatíveis com o número de repetições máximas estipuladas para cada exercício, o que correspondeu a cerca de 70-85% de 1RM. Todas as cargas foram aferidas individualmente em cada exercício através do teste de peso máximo, na
última semana da fase de pré-treinamento. Estas cargas sofreram reajustes periódicos, de acordo com os ganhos complementares de força e as adaptações provocadas pela seqüência de treinamentos. Desse modo, foram mantidas as intensidades iniciais do trabalho.

A programação A foi composta por exercícios para os grupamentos musculares do peitoral, ombros e tríceps, sendo repetida no primeiro e quarto dia de treinamento semanal.

A programação B envolveu exercícios para os grupamentos musculares das costas, bíceps braquial e antebraço, sendo repetida no segundo e quinto dia. Por fim, a programação C foi composta por exercícios para os grupamentos musculares das coxas, pernas e abdômen, sendo repetida no terceiro e sexto dia de treinamento semanal.

O intervalo de recuperação permitido entre as séries, em cada exercício, foi de sessenta a noventa segundos; entre os exercícios de um mesmo grupamento muscular, de dois a três minutos; e entre os exercícios para grupamentos musculares diferentes,
nunca foi inferior a cinco minutos.

Teste de força muscular
O teste escolhido para a avaliação dos níveis de força muscular, nos diferentes momentos do estudo (M1 - início; M2 - fim da aplicação do 1o regime dietético;
M3 - fim da aplicação do 2o regime dietético), foi o teste de peso máximo (1RM), descrito por CLARKE (1973), por ser a técnica mais empregada para essa finalidade (MAYHEW et al., 1995).

Para tanto, foram escolhidos cinco exercícios comumente utilizados nos programas de treinamento de musculação de atletas de culturismo, de acordo com sua abrangência, ou seja, maior número de grupamentos e feixes musculares envolvidos na realização dos movimentos, permitindo assim a utilização de sobrecargas mais elevadas. Foram eles: extensões de tríceps com barra (supine triceps extensions), desenvolvimento pela frente (military press), supino (bench press), levantamento de terra (deadlift)
e agachamento (squat).

Para a obtenção de 1RM, em cada exercício, foram utilizadas um máximo de três tentativas, respeitando-se um intervalo de recuperação entre cada uma de 3 a 5 minutos, no intuito de garantir a eficiência do teste mediante o restabelecimento das fontes energéticas primárias utilizadas durante o esforço, ou seja, o sistema dos fosfagênios (ATP-CP).

A carga máxima foi definida como sendo aquela que pudesse ser deslocada apenas uma única vez, em uma amplitude completa de movimento (combinação entre as ações musculares concêntrica e excêntrica), mantendo-se a técnica de execução considerada
correta.

Ingestão alimentar e protocolo dietético
Com a finalidade de conhecer a alimentação diária de cada um dos atletas foram utilizados os métodos de recordatório de 24 horas e registro alimentar de 3 dias, avaliando-se a quantidade e qualidade dos alimentos ingeridos, a partir de tabelas de
composição química dos alimentos (FRANCO, 1989).

A partir daí, conhecidos os hábitos alimentares dos atletas, coube a uma utricionista a elaboração de duas dietas, comuns aos hábitos alimentares destes. A primeira, de composição habitual, denominada de D1, continha cerca de 61 kcal/kg de peso corporal/dia e 1,5 g/kg de peso corporal/dia de proteína (integral). A segunda (D2), elaborada a partir de D1, foi acrescida de carboidratos acompanhados da suplementação de 1 g/kg de peso corporal/dia de aminoácidos (Amino 2000), resultando em 2,5 g de
proteína/kg de peso corporal/dia e 80 kcal/kg de peso corporal/dia. A ingestão de proteína dietética fora calculada assumindo-se que cada grama de nitrogênio eqüivale a 6,25 g de proteína.

A dieta D1 foi elaborada com arroz, feijão, frango grelhado, batata cozida, alface, óleo de soja, leite, nescau, pão, margarina, fécula, mel, banana, laranja e suco de laranja, contendo cerca de 10,2% de proteína, 12,2% de lipídeos e 77,6% de carboidratos.

A dieta D2, por sua vez, ofereceu aproximadamente 13% de proteína, 13% de lipídeos e 74% de carboidratos a partir dos alimentos mencionados em D1, com o acréscimo de macarrão caseiro cozido, alho, azeite de oliva e goiabada. Todos os alimentos foram
selecionados, adquiridos, temperados, cozidos, porcionados e distribuídos individualmente aos atletas, pela nutricionista, para serem fracionados em 6 (seis)
refeições diárias (desjejum, colação, almoço, lanche, jantar e ceia). As eventuais sobras foram computadas no cálculo da ingestão diária.

Os atletas receberam cada uma das dietas durante 15 (quinze) dias consecutivos, iniciando-se por D1. Durante todo o experimento a ingestão de água foi ad libitum.

Avaliação antropométrica
O peso corporal (P) e a estatura (A) foram aferidos de acordo com os procedimentos descritos por GORDON et al. (1988). A partir das medida de peso e estatura calculou-se o índice de massa corpórea (IMC) por meio do quociente peso corporal/estatura2, sendo o peso corporal expresso em quilogramas (kg) e a estatura em metros (m).

A composição corporal foi obtida pela técnica de espessura do tecido celular subcutâneo. Para tanto, foram aferidas as seguintes dobras cutâneas: abdominal (AB), suprailíaca (SI), subescapular (SE), tricipital (TR), perna-medial (PM) e coxa (CX)
de acordo com as técnicas descritas por HARRISON et al. (1988), com exceção da dobra abdominal determinada paralelamente ao eixo longitudinal do corpo, aproximadamente dois centímetros à direita da borda lateral da cicatriz umbilical (GUEDES, 1994). O percentual de gordura foi estimado pela fórmula de SIRI (1961), a partir da equação específica de Guedes (1985) para o cálculo da densidade corporal.

Foram avaliadas também as circunferências de braço relaxado (CB), braço contraído (CBC), antebraço (CAT), abdômen (CAB), perna (CP) e coxa (CC) de acordo com as técnicas convencionais, descritas por CALLAWAY et al. (1988). As exceções foram as
circunferências de coxa, tomada no ponto meso-femural (RODRIGUES & ROCHA, 1985) e braço contraído, tomada no ponto meso-umeral, no final de uma contração voluntária máxima do bíceps, de acordo com a técnica descrita por FRANÇA & VÍVOLO (1987).

A área muscular do braço (AMB) foi calculada a partir da seguinte equação (FRISANCHO, 1984): AMB (cm2) = {[CB (cm) - p.TR (cm)]2/4.p} - 10
A massa muscular (MM), em gramas, foi calculada de acordo com a equação proposta por MARTIN et al. (1990):MM = A(0,0553.Gt2 + 0,0987. Gf2 + 0,0331Gc 2) - 2445
onde A é a estatura, Gt é a circunferência de coxa corrigida pela sua respectiva dobra cutânea, G f é a circunferência máxima de antebraço e G c é a circunferência
máxima de panturrilha corrigida pela dobra cutânea de perna medial, sendo todas as medidas em cm. As correções das circunferências foram feitas sendo elas subtraídas por p vezes as respectivas dobras cutâneas (JELLIFFE & JELLIFFE, 1969).

Todas essas medidas foram aferidas nos três momentos do estudo: M1 (na véspera do início da aplicação do protocolo dietético D1), M2 (no último dia de aplicação de D1) e M3 (no último dia de aplicação de D2).

Análise estatística
Os resultados obtidos nos três momentos do estudo foram agrupados em valores de média e desvio-padrão e as diferenças foram contrastadas mediante análise de variância para medidas repetidas (ANOVA). O teste de Scheffé foi empregado para a localização das diferenças entre os tratamentos nos diferentes momentos, sendo adotado como nível de
significância p <> levantamento de terra (11,2%) > extensões de tríceps (11%) > supino (10,4%) > desenvolvimento pela frente (5,8%).

De forma semelhante, o índice de força relativa dos atletas estudados (IF), representado pela relarelação entre a carga total levantada nos cinco exercícios
(CL) e o peso corpóreo (tabela 1) elevou-se significativamente em 8,9% durante o experimento (M3/M1) (tabela 4).

DISCUSSÃO
Devido ao número reduzido de atletas selecionados, optou-se pela aplicação de dois regimes dietéticos diferentes, de forma consecutiva e não no sistema cruzado
(cross-over). No entanto, houve a preocupação de que o período de aplicação de cada regime dietético fosse de quinze dias, para que fossem evitadas interferências
da dieta precedente sobre os resultados.

A superestimação do balanço nitrogenado pode refletir adaptação insuficiente à dieta e é relativamente comum em todos os estudos dessa natureza. Segundo HEGSTED (1975), períodos adaptativos de dez dias são, provavelmente, adequados quando da diminuição da ingestão protéica. Por outro lado, períodos iguais ou superiores a duas semanas são necessários para estabilização metabólica quando a ingestão protéica é aumentada. No entanto, quando o incremento protéico for pequeno (< >CONCLUSÃO
Os dados encontrados neste estudo sugerem que a ingestão protéica entre 1,5 e 2,5 g de proteína/kg de peso corporal/dia, associada ao treinamento com pesos, pode contribuir de forma significativa para o aumento de força e massa muscular. Tais achados vêm ao encontro das necessidades dos atletas de culturismo em períodos não competitivos (fase de treinamento hipertrófico), quando o principal objetivo é gerar aumento significativo no volume corporal, à custa, predominantemente, do desenvolvimento da massa muscular.

Finalmente, vale ressaltar que a utilização de dietas hipercalóricas e hiperprotéicas, como as empregadas no presente estudo, com os atletas em período de treinamento para hipertrofia, desacompanhadas de treinamento aeróbio regular pode comprometer negativamente a aparência estética, mediante o aumento nos depósitos
de gordura corporal subcutânea, dificultando o processo de definição muscular, durante o período pré-competitivo.

AUTORES:
Edilson Serpeloni Cyrino
Centro de Educação Física e Desportos – FEF/UEL

Nailza Maestá
Faculdade de Medicina – UNESP/Botucatu

Roberto Carlos Burini
Faculdade de Medicina – UNESP/Botucatu